terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Lembranças infantis

Era 2000. Eu ainda morava na Rua dos Ourives. Ourives que depois, no auge dos meus 11 anos, fui descobrir que eram os artesãos que mexiam com ouro. Aquilo foi uma grande descoberta para mim. Enfim, era a Rua dos Ourives, condominio Veneza. Morávamos no 14º andar. Uma altura razoável e dava para ver a Imigrantes ou a Anchieta, não me lembro muito bem. Também era perto do zoológico e do parque estadual. Eu morria de medo do parque porque foi lá que o maníaco do parque matou todas aquelas moças. Enfim, era a Rua dos Ourives, condominio Veneza, ano 2000. Eu, ainda com o uniforme do Visconde de Itaboraí, colégio onde fiz a quarta série. A camiseta era branca, com um grande V em vermelho. O shorts era cinza meio claro, com duas linhas ao lado: uma também vermelha e outra branca. Eu vivia com este uniforme, eu o adorava. Ele era tão diferente dos azuis convencionais. Enfim, eu estava em cima do sofá daquele apartamento minúsculo da Rua Ourives. Meu irmão, então com 17 anos, estava com um desodorante na mão. What I Got, do Sublime. Era isso o que cantávamos. As meias nos pés, outro desodorante na mão. Dividíamos os vocais. Éramos uma dupla muito boa: ele, garoto franzino, ombros ainda em formação, cabelo molhado e bagunçado, uma pinta de nascença no pescoço. Eu, cabelos loiros cacheados em uma muvuca total, barriguinha saliente e sem nenhuma malícia. Aquela sala era o nosso palco e a varanda, o nosso público. Cada verso, cada acorde era uma diversão a mais. O número musical era estupendo: tinha fogos de artifício, público gritando e todos os instrumentos em total harmonia. Era divertido imaginar tudo aquilo. E pensar que começara de forma tão boba, com o meu irmão fazendo alguma besteira para a irmã mais nova dar risada. Era assim. Apesar de ter convivido tão pouco tempo, aquele menino sempre fora o meu predileto. Todos os dias ele me levava e buscava na escolinha. Cada dia uma história diferente. Mas ás vezes ele sumia e um carro com luzes o trazia de volta. E a minha mãe... ah, a minha mãe gritava com ele, mas depois o abraçava. Um dia, porém, o carro com luzes veio sem ele e não o vi por pelo menos dois anos. Outro dia, então,ele foi me buscar na escola. Eu, de saia plissada, chorei quando o abracei. Mas daí foram mais três anos ausentes, mais quatro, por fim, foram oito anos. Quando ele voltou, encontrou a menina desgrenhada usando roupas pretas e maquiagem escura. De mãos dadas com um cara de 2 metros e passava noites fora. Eles não se conheciam mais. Mas se amavam, se amavam como irmãos que cresceram juntos e se cuidaram. Até que no dia, o mesmo que ela brincou que o carro que ele usara na noite anterior cheirava a sexo, ele não voltou mais. Ela não ouvia mais a risada dele e não via mais a manchinha no pescoço. Mas a Rua dos Ourives, o ano 2000 e What I Got do Sublime voltaram10 anos depois, quando eu estava indo para mais um dia de trabalho...

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