segunda-feira, 31 de maio de 2010

Nos meus sonhos eu fujo
Faço as malas e sumo
Vou andando devagar pra você me alcançar
Viro numa esquina e paro no mesmo lugar
Em que eu te conheci
Mas você não estava lá dessa vez
Para me dizer pra onde devo ir
Eu sei que quando anoitece
Nos teus sonhos também estremece
A vontade de fugir
Então siga por ali
Vire aquela esquina e vamos partir

Fuga nº1 - Thiago Pethit

quarta-feira, 19 de maio de 2010


Eu tive um balão...

Talvez, a última vez que me senti verdadeiramente feliz foi quando eu ganhei um balão. Aos 20 anos, saía de um dia desastroso no trabalho quando me deparei com um moço me esperando e, surpreendentemente, segurando um balão rosa. Não consegui olhar para nenhum outro lugar além daquela bola flutuante. Senti, assim, sem querer, os meus olhos brilhando diante de uma cena tão improvável. Depois, dei risada ao ver o marmanjo pulando para conseguir resgatar mais dois balões que estavam perdidos no teto da entrada do prédio. Fui caminhando até o ponto de ônibus ostentando três bolas rosas. Andava com o peito estufado e não conseguia tirar os olhos deles. Lembrei-me da infância, das enormes bolas que eu comprava quando ia ao Parque do Carmo, do meu medo de bexigas, dos meus dias mais pueris. "Eu os peguei para que você pudesse soltá-los". Comprei um alfajor e, enquanto atravessava a avenida Cidade Jardim, decidi dar a liberdade ao trio que alegrou o meu domingo desastroso. No canteiro central, eu os vi flutuar até bem alto, até eles fugirem do alcance da minha visão debilititada pela miopia. Enquanto terminava o meu doce, o moço apontava para o céu dizendo que ainda conseguia vê-los. Já eu não me importava mais aonde eles estavam, continuei deliciando-me com a lembrança de como tinha sido feliz enquanto tive aqueles três balões rosa.


terça-feira, 18 de maio de 2010

olhos de ressaca


Tinha-me lembrado a definição que José Dias dera deles, "olhos de cigana oblíqua e dissimulada." Eu não sabia o que era obliqua, mas dissimulada sabia, e queria ver se podiam chamar assim. Capitu deixou-se fitar e examinar. Só me perguntava o que era, se nunca os vira, eu nada achei extraordinário; a cor e a doçura eram minhas conhecidas. A demora da contemplação creio que lhe deu outra idéia do meu intento; imaginou que era um pretexto para mirá-los mais de perto, com os meus olhos longos, constantes, enfiados neles, e a isto atribuo que entrassem a ficar crescidos, crescidos e sombrios, com tal expressão que...Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá idéia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros, mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me.

Dom Casmurro - Machado de Assis

Não sei se tenho feições muiito peculiares, mas ouço os elogios mais inusitados. E gosto deles. O mais comum é dizerem que pareço uma pintura renascentista ou uma mulher vitoriana. Segundo uma amiga, é tudo culpa das bochechas salientes e da boca meio bicuda. A primeira vez que ouvi algo do tipo foi no meu segundo ano de colegial, de um professor de História. Depois a história se repetiu em um sebo da Augusta, quando o vendedor disse que eu parecia uma pintura do Da Vinci. Porém, o elogio que guardo com mais carinho é o de um amigo, que disse que tenho olhos de ressaca, assim como os da Capitu. Não acredito, acho os meus castanhos tão sem vida, mas gosto de pensar que posso ser tempestuosa e tragante, tanto quanto a moça que enfeitiçou Bentinho. Tá bom que não sou a maior fã de Machado de Assis, mas guardo boas lembranças deste quote que já esteve no meu falecido fotolog.


terça-feira, 11 de maio de 2010

the breakfast club



Saturday, March 24,1984. Shermer High School, Shermer, Illinois, 60062. Dear Mr. Vernon, We accept the fact that we had to sacrifice a whole Saturday in detention for whatever it was we did wrong. What we did "was" wrong. But we think you're crazy to make us write an essay telling you who we think we are. What do you care? You see us as you want to see us - in the simplest terms, in the most convenient definitions. You see us as a brain, an athlete, a basket case, a princess and a criminal. Correct? That's the way we saw each other at 7:00 this morning. We were brainwashed.

The Breakfast Club, conhecido por aqui como O Clube dos 5, poderia ser apenas mais um filme adolescente. Mas, não, é muito mais que isso. É inquietante, engraçado e, ao mesmo tempo, reconfortante. Enfim, mais um filme que deixa uma sensação em mim. Se boa ou ruim, isso não importa.


família, ah!

I
Rogério, solteiro, 38 anos e já quase não tinha cabelos no topo da cabeça. Calvice, herança familiar, recessivo na parte do pai, dominante nos genes da mãe. Gostava de jogar bola, mas a barriga, que lhe impedia de tocar os próprios pés, o impedia de ter um bom desempenho em campo. Tendência a engordar, puxou do lado paterno: senhor Afonso, 65 anos e mais de 100 quilos. “Ê, Rogério, por que não rola junto com a pelota?”. O pessoal do escritório ria.
Coitadas são as nossas famílias. Mesmo tendo as melhores das intenções, a culpa de todas as nossas frustrações sempre recai sobre os nossos parentes. Culpa de nossa família, que nos acolhe ou nos expulsa, que nos agrada ou nos repudia.
Era assim. Rogério sempre se sentia claustrofóbico entre as pessoas que passeavam naquela sala apertada. Fumaça de cigarro, cachimbo. Mais tarde culparia o vício paterno e as reuniões familiares pelo câncer na faringe que viria a ter e pelo qual morreria. Em sua mente, ele ironizava a risada retumbante de seu velho pai e a maneira com que Dona Madalena, bonita, olhos azuis vívidos, tentava agradar a todos. Quando chegara, foi recepcionado com aquele carinho típico de mãe. “Mas, meu filho, está cada vez mais gordinho, não?”. Risadas. Fora o primeiro golpe na auto-estima, a primeira casca que soltara da proteção que sempre construía e onde aprisionava um monstro furioso.
Sentado, perto da estante de livros, estava o tio que todos consideravam inválido. Já bastante idoso, mas sem perder aquele brilho inteligente que todo bom leitor sustenta em seu olhar. Alberto usava óculos finos, pousados na ponta de seu odunco nariz. Quase não falava. Nada demais para um velho. Seu silêncio era apenas interrompido às vezes para uma risada singela, sarcástica. Os olhos dos dois homens, em lados opostos da sala, se cruzaram e, junto com o cheiro de pele já idosa, veio a frase “eu também os odeio...”, que ressoou durante todo aquele feriado natalino, como o consolo de que nem todo ódio é único.

II
Você ligou para a residência do Rogério. Favor deixar o recado após o sinal... BIP

Olha, filho. Eu sei que você não gosta de nossas reuniões familiares. Percebo em seu olhar, o modo como foge de meu carinho, como não gosta que eu fale de sua barriguinha na frente de seus tios. Falando nisso, que barriguinha, hein? Lembro de quando a mordia, junto com as dobrinhas do bebê gordinho que você sempre foi. Você vai ser, para sempre, o meu bebê, tá? Tô ligando para dizer que aquele seu tio, o Alberto, morreu. Pois é. Estava inválido já, o coitado, não? Tinha cheiro de gente velha, as vezes eu pensava ver poeira em suas rugas. Enfim, morreu feliz, dormindo na casa de repouso. Percebi que conversaram no último natal. Percebi que vocês se aproximaram naquele feriado, por isso achei que eu mesma precisava te dar esta notícia. Falando nisso, como vai aquele probleminha na garganta? Você precisa ir ao médico, menino! Eu sei que já é grandinho, que já tem 38 anos e bla bla bla, mas sou mãe e o meu coração fica apertado. Estou tentando convencer o seu pai a parar de fumar cachimbo. Deve ser por isso que você tem essa voz tão rouca, o Afonso fumou tanto durante a sua infância. E a análise, como vai? Os probleminhas com a auto-estima, como vão? Espero que bem, lembro de quando você explodiu naquele domingo. Era outra pessoa, era um monstro, não o reconhecia. Ai, filho, desculpa falar assim, dessas coisas agora. É que estou preocupada. Só espero que a morte do Alberto não piore a sua situação. E o pessoal do escritório? Ainda rindo da sua pancinha? Espero que o futebol de quinta-feira esteja fazendo efeito sobre o seu peso. Outra coisa, comprei um remédio para calvice ótimo, um que eu lembro que o meu pai usava. Ele faz crescer cabelo! É ótimo, meu filho. Estou mandando amanhã mesmo, tá bom? Bom, vou indo. O velório vai ser hoje, durante a noite, e o enterro amanhã. Apareça se puder. Te amo, filhinho querido, piquituxo da mamãe.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

So stay there
'Cause I'll be comin' over
And while our bloods still young
It's so young, it runs
And we won't stop til it's over
Won't stop to surrender